quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Para pensar...

Como a mulher e o homem confrontam os 60 anos? O novo filme da diretora
Julie Gavras, exibido na mostra internacional de São Paulo e com estreia
prevista para 11 de novembro, trata de envelhecimento. De como esconder ou
assumir a idade. Aos 60 você se sente maduro, curioso e sábio ou velho,
amargo e ultrapassado? O título do filme no Brasil é assombrosamente ruim e
apelativo: Late bloomers - O amor não tem fim. “Late bloomer” é uma
expressão inglesa que denomina quem amadureceu tardiamente. Em francês, a
tradução do título é clara e objetiva: Trois fois vingt ans (Três vezes 20
anos). Uma conta básica de multiplicação mostra que você já viveu bastante.
Um dia teve 20 anos. Também comemorou ou receou os 40. E agora, aos 60,
passa para o time dos velhos. Ou não?
Isabella Rossellini (Mary) e William Hurt (Adam) fazem o casal
protagonista. Devido a um súbito lapso de memória, a mulher, professora
universitária, percebe que envelheceu e toma medidas concretas em casa.
Aumenta o tamanho dos números no aparelho de telefone, coloca barras na
banheira para o casal não escorregar. O homem, arquiteto famoso, se recusa
a se imaginar velho, passa a conviver só com jovens e a se vestir como
eles. Ela faz hidroginástica, mas se sente fora d’água, organiza reuniões
com idosas e mergulha em trabalhos voluntários. Ele vai para o bar, bebe
energéticos e vira a noite. Cada um se apega a sua visão de como envelhecer
melhor, sem concessões. Ambos acabam tendo casos extraconjugais. Há nos
dois um desespero parecido. Mary exagera na consciência da proximidade da
morte. E Adam exagera na negação. Depois de décadas de amor sólido, com os
três filhos fora de casa e já com netos, o casal se vê prestes a engrossar
as estatísticas dos divorciados após os 60 anos, ao descobrir que se
tornaram estranhos e por isso ficam melhor sozinhos e livres. O filme é uma
comédia romântica para a idade avançada, um gênero quase inexistente.
Julie Gavras não encontrou nenhuma atriz francesa que assumisse com humor
os dilemas de uma sexagenária. “Precisava de alguém com a idade certa, mas
que não tivesse feito cirurgia plástica”, diz Julie. “Isabella foi perfeita
porque entende que, quanto mais velha fica, mais liberdade tem.” Na França,
diz a cineasta, “a idade é uma questão delicada para a mulher”. No Brasil,
que cultua a juventude feminina como moeda de troca, é mais ainda.
Isabella, um dos rostos mais lindos do cinema, disse ter adorado fazer um
filme sobre envelhecimento: “São tão poucos e tão dramáticos. E minha
experiência tem sido pouco dramática, aliás bem cômica às vezes. Mulheres
envelhecendo são vistas como uma tragédia e foi preciso uma cineasta mulher
para ver diferente”.
Homens e mulheres reagem de maneira desigual à passagem dos anos? É
arriscado generalizar. Depende de cada um. Compreendo que mulheres de 60
sintam mais necessidade de parecer jovens e desejáveis - mas alguns homens
idosos se submetem a riscos para continuar viris. A obsessão da juventude
eterna criou um grupo de deformadas que se sujeitam a uma cirurgia plástica
por ano e perdem suas expressões. Mas também fez surgir outro tipo de
sexagenárias, genuinamente mais belas, mais em forma, mais ativas e
saudáveis enfim.
“As mulheres nessa idade querem aproveitar o mundo, viajar, passear,
dançar, ver filmes e peças, fazer cursos. Os homens querem ficar em casa,
curtir a família, os netos”, afirma a antropóloga Mirian Goldenberg, que
acaba de publicar um livro sobre a travessia dos 60. “Elas se cuidam mais,
eles bebem mais. Elas vão a médicos, fazem ginástica, eles engordam, gostam
do chopinho com amigos ou sozinhos. Elas envelhecem melhor, apesar do mito
de que o homem envelhece melhor. Muitas me dizem: ‘Pela primeira vez na
vida posso ser eu mesma’.”Da velhice ninguém escapa, a não ser que a morte o resgate antes. Cada um
lida com ela de forma pessoal e intransferível. O escritor Philip Roth, aos
78 anos, diz que “a velhice não é uma batalha; é um massacre”. Mas produz
compulsivamente. Woody Allen, de 75 anos, dirige um filme por ano, mas acha
que não há romantismo na velhice: ” Você não ganha sabedoria, você se
deteriora”. Para Clint Eastwood, de 81 anos, que ficou bem mais inteligente
e charmoso com a idade, envelhecer foi uma libertação: “Quando era jovem,
era mais estressado. Me sinto muito mais livre hoje. Os 60 e 70 podem ser
os melhores anos, desde que você mude ou evolua”. Prefiro acreditar em
Eastwood. Por mais que a sociedade estabeleça como idoso quem tem acima de
60, a tendência é empurrar o calendário para a frente. Hoje, para os
sessentões, velho é quem tem mais de 80. Os octogenários produtivos acham
que velho é quem passou dos 90. No fim, velho mesmo é quem já morreu e não
sabe.RUTH DE AQUINO é colunista de ÉPOCA

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